Escravos e livres
Escravo, uma palavra forte, designando dependência e submissão, sem liberdade de ir e vir, um direito humano fundamental.
Há escravos e escravo: uns escravos de outros homens; outros escravos de si mesmos. E pergunto: qual a pior escravidão? A submissão, a dependência de um outro, a dependência de seus próprios instintos e caprichos? Em qual das duas situações a escravidão é mais dolorosa e a verdadeira liberdade tem menores chances de acontecer?
Oficialmente ou legalmente, já não há mais escravos físicos, homens ou mulheres impedidos no seu direito de ir e vir, propriedade de um dono que os comprou por um preço determinado em algum mercado de escravos. Infelizmente a chamada “Lei Aurea” ainda é apenas uma lei, quase letra morta diante das modernas escravidões de milhares de operários pobres, contratados para grandes fazendas ou empresas, onde são mão de obra barata e apenas trabalham, em condições inumanas, para sobreviver.
Mas vamos olhar aqui mais para este outro tipo de escravidão, a escravidão de si mesmo, dos próprios instintos, dos desejos, da glória ou de poder político e econômico. Quando alguém se torna escravo de si mesmo, ele passa a não se compreender. E passa por cima de valores que, um dia, lhe foram caros e orientadores de sua vida, torna-se egoísta, trapaceiro, corrupto e corruptor, chantagista e explorador. Para alcançar os seus fins não duvida um instante em vender alma, mente e coração. Para levar vantagem em tudo, torna-se violento, destruidor.
Para o escravo de si mesmo, incomoda a presença duma pessoa livre. Isto explica o assassinato de Abel, morto por seu irmão Caim; explica a morte de Jesus e de milhares e milhares de seus verdadeiros seguidores; explica a morte de uma Joana D’ Arc, um Tiradentes, um Luther King, um padre Josimo, uma Margarida, um Chico Mendes, um Oscar Romero, um Ellacuria e companheiros jesuítas, uma irmã Dorothy, explica a morte de milhares de homens e mulheres, que também neste novo milênio morrem anônimos, porque tem ousadia de serem livres. E , livres, ousam denunciar as injustiças e anunciar a verdade.
Quando o escravo se defronta com um homem livre, ele sente uma repulsa imediata dentro de si. O homem livre é um desafio a escravidão. E não pode haver coexistência pacífica entre escravidão e liberdade, entre escravos e homens livres!
Os escravos conhecem muitas formas ou técnicas para matar os homens livres. As vezes lhes convém não matá-los fisicamente porque não querem mártires; então matam na alma. Matam pela calúnia, pela mentira, pelo desprezo, pelo ridículo, pela marginalização. É muito incômoda para o escravo a presença dum homem livre. O homem livre é o homem da verdade; e os escravos de si mesmos, filhos da mentira odeiam verdade. Por isso não podem sentir junto a si a incômoda presença de um home livre, sinônimo de verdade.
Há quase dois mil anos aquele homem livre que morreu numa cruz, porque era verdadeiro, falou e disse: “A verdade vos libertará”.
Do livro Vida que te quero Viva- Pe. Attilio Hartmann-SJ
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