A comunicação que não comunica
A esta altura do campeonato,
ninguém mais tem dúvida: se há algo que, no mundo, caminha a passos de gigante
– como se dizia nos tempos em que as coisas andavam normalmente, ou seja,
devagar – é a comunicação. Com três ou quatro anos, qualquer criança já é perita
em tudo aquilo que eu nada entendo, como ipad, iphone, tablet, facebook,
twitter, smartphone, etc.
Mas – já que perguntar não ofende
– pode-se afirmar, sem mais nem menos, que a comunicação é a grande conquista
da sociedade atual? Para uma multidão de pessoas, a resposta vai em sentido
contrário. Uma delas é Jean-Paul Sartre (1905/1980). Em sua célebre peça “A
portas fechadas”, ele coloca num mesmo quarto de hotel um homem e duas
mulheres. O local é hermeticamente fechado: não há janelas e a porta está
trancada. A luz é intensa e o calor, insuportável.
Os três inquilinos acabaram de
falecer, e o lugar onde se encontram, é o inferno. Depois de uma vida devassa,
onde o egocentrismo reinou soberano, ei-los imóveis, impassíveis e silenciosos,
um frente ao outro, “comunicando” através dos olhos frios e inflexíveis o que
lhes pesa no coração: a raiva e a frustração. Em dado momento, a tensão é
tamanha, que um deles explode e diz para os outros dois: “Vocês lembram do
enxofre, do fogo, dos diabos que os padres diziam existir? Como vêem, nada
disso é verdade. O inferno são os outros!“.
Se comunicar é transmitir e
oferecer o que se tem no coração, talvez Sartre tenha razão: é exatamente isso
que faz da vida um inferno quando é somente o mal que vem à tona. Mas, pode
acontecer também o contrário: se é o bem que irradiamos, o paraíso começa aqui
e agora.
Infelizmente, a comunicação
cresce em sofisticação, evolui na técnica, mas deixa a desejar no que é
essencial: a comunhão, partilhando as graças que Deus derrama em quantos se
abrem ao seu amor. A história da humanidade é o reflexo da história que cada
ser humano desenvolve em seu interior. Façamos a experiência: nos dias em que
tudo nos anda “atravessado”, dominados pela raiva, pela tristeza e pela
desesperança, em poucos minutos contagiamos a todos os que nos cercam. Mas, se
você tentar superar suas mágoas e amar (do jeito de Deus) cada pessoa que se
aproxima, verá que, em poucos instantes, o céu começa a brilhar ao seu redor.
Por que os meios de comunicação
social preferem muito mais divulgar notícias aliadas aos sete vícios capitais
do que aos sete dons do Espírito Santo? Não será porque somos muito mais
influenciados por aqueles do que por estes? Ao leitor, a resposta!
Para o cristão, comunicação é a
de Pentecostes, não a de Babel. Se, em Babel, as muitas línguas foram fruto do
orgulho e causa de separação, em Pentecostes, elas criaram conversão e
comunhão: “Todos ficaram repletos do Espírito Santo e começaram a falar em
outras línguas, conforme o Espírito lhes concedia. Cada um dos presentes os
ouvia em sua própria língua anunciar as maravilhas de Deus” (At 2,4.11). É
sempre assim: todos entendem a linguagem do amor!
Talvez tenha sido por isso que o
Papa Bento XVI, em sua mensagem para o Dia Mundial das Comunicações Sociais de
2012, lembrava que comunicar é, antes de tudo, silenciar, escutar e acolher: “O
silêncio é parte integrante da comunicação e, sem ele, as palavras ficam sem
conteúdo. No silêncio, escutamo-nos e conhecemo-nos melhor a nós mesmos, nasce
e se aprofunda o pensamento, compreendemos com maior clareza o que queremos
dizer ou ouvimos do outro, discernimos como nos devemos exprimir. Calando,
permite-se à outra pessoa que fale e se exprima a si mesma, e nos impede de
ficarmos presos, por falta de adequada confrontação, às nossas palavras e
ideias. Abre-se, assim, um espaço de escuta recíproca e a relação humana fica
mais plena. É no silêncio que se identificam os momentos mais autênticos da
comunicação entre aqueles que se amam: o gesto, a expressão do rosto, o corpo,
enquanto sinais que manifestam a pessoa. No silêncio, falam as preocupações, as
alegrias, os sofrimentos, que encontram nele uma forma particularmente intensa
de expressão. Do silêncio, nasce uma comunicação ainda mais exigente, que faz apelo
à sensibilidade e a uma capacidade de escuta que frequentemente revela a medida
e a natureza dos laços“.
Por Dom Redovino Rizzardo - Bispo de Dourados (MS)
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