Apaixonados e Proféticos
No atual contexto de
secularização, pode parecer estranho que jovens se interessem pela consagração
da própria vida a Deus. Mas é o que está acontecendo de forma crescente em
muitos lugares. Realidades culturais do interior e das grandes cidades
verificam uma nova tendência no campo das vocações. Não é difícil encontrar em
seminários, movimentos, congregações e novas comunidades eclesiais jovens
estudantes, mas também engenheiros, pedagogos, publicitários, advogados e até
médicos. Gente trabalhadora que se sentiu chamada a deixar tudo para se doar
totalmente a Deus no serviço à humanidade, especialmente aos que mais sofrem.
Numa análise imediata esses
jovens podem ser considerados loucos e ilógicos. Indo mais a fundo na avaliação
dessa tendência, com certeza, serão vistos como apaixonados e proféticos.
Afinal, essa é uma decisão que vai além do simples fato de romper com o meio ou
nível de vida em que estão inseridos. É, na verdade, uma ruptura visceral e
profunda com o próprio eu, muitas vezes propenso socialmente a dominar, para
assumir um estilo de vida simples, longe de vaidades. Um jeito de viver na
gratuidade da entrega do que se é e do que se tem para fazer a pessoa humana
ser mais feliz na Igreja e na sociedade.
A visão do papa João Paulo II na
Exortação Apostólica Pastores dabo vobis, que fala sobre a formação sacerdotal,
define claramente quem são esses jovens. São “portadores dos ideais que fazem
caminho na História” através da “sede de liberdade, reconhecimento do valor incomensurável
da pessoa, necessidade de autenticidade e transparência, novo conceito e estilo
de reciprocidade nas relações entre homem e mulher, procura sincera e
apaixonada de um mundo mais justo, solidário e unido, abertura e diálogo com
todos, empenho a favor da paz”, explica o papa.
E é bem esse o perfil encontrado
em grande parte daqueles que estão hoje nos ambientes de formação à vida
consagrada. Numa sociedade onde se valoriza o poder e a posse, há jovens
preferindo a pobreza evangélica, apostando viver a comunhão dos bens, a exemplo
dos primeiros cristãos que “possuíam tudo em comum”. Num contexto de fortes
estímulos sexuais, há jovens que escolheram livremente uma vida disciplinada e
pura em comunhão fraterna, onde os corações tem sede da virgindade que trona
possível a liberdade de amar sem desejar possuir nada nem ninguém. Diante dos
conflitos de autoridade, há jovens que decidiram aceitar ir para qualquer lugar
ou assumir qualquer trabalho. Isso vai
desde dormir com os pobres nas ruas da metrópole de São Paulo, ou partir para o
Haiti e ajudar na reconstrução social e cristã do país, após a tragédia do
terremoto. Passa pelo dedicado profissionalismo de digitalizar a programação
evangelizadora de uma TV, ou pelo silêncio do claustro de um mosteiro, onde
rezará durante toda a vida em profunda solidariedade com os problemas do mundo.
Ou ainda pela missão de ser envidado para ser construtor da unidade em um país
marcado pelo comunismo ou em outro com necessidades especiais de diálogo entre
culturas e religiões.
Espontâneos, dóceis e fortes são
esses jovens. Esquecendo-se de si mesmos, comprometem-se até as últimas
consequências. Amam além das palavras e estão decididos a nunca trair. Afinal,
por sonharem deixar a marca de Deus na História estão fazendo a diferença na
Igreja e restituindo a muitos o encanto por ela. Indiscutivelmente, isso leva a
pedir: “Envia-nos, Senhor, mais jovens apaixonados e proféticos. Amém”!
Por Pe. Ricardo Antônio Pinto
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